Transcirção: Hidronímia da região do Rio das Velhas:de Ouro Preto ao Sumidouro (Letícia Rodrigues Guimarães Mendes Belo Horizonte, setembro de 2009)
CAPÍTULO II – CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICO -GEOGRÁFICA
2.2.1. Fernão Dias e a expedição em território mineiro: caminhantes e caminhos:
Fernão Dias contava 66 anos na data em que sua comitiva se pôs em marcha rumo ao território mineiro, o que se deu no ano de 1674. Algum tempo antes, em 20 de outubro de 1672, recebera, do Governador Afonso Furtado, a carta-patente que lhe concedia poderes sobre os integrantes de sua bandeira e o nomeava chefe e governador das Esmeraldas. Fernão Dias convocou por adjunto e sucessor o Capitão Matias Cardoso e, é importante frisar, ambos partiram, com a comitiva, munidos por meio da venda de algo de suas propriedades e posses, visto que à Coroa apenas interessava a parte nos lucros. No que diz respeito à formação da bandeira, propriamente dita, assinala Vasconcelos (1974, p.77
"Cada potentado, conquistador, tinha sua bandeira de guerra distintiva, como os senhores da Idade Média. Era esta um símbolo de poder próprio reconhecido pelo Governador. Os que se alistavam, chamavam-se bandeirantes desse ou daquele dono, que exercia poder soberano e absoluto de caráter marcial sobre a tropa em diligênciae no recinto de seu latinfúndio".
O número dos que se puseram em marcha nessa empreitada é apenas estimado, sendo que não há, por parte dos pesquisadores, um número exato: quarenta homens brancos, afora o próprio Fernão Dias e seu filho, Garcia Rodrigues, muitos aliados, como seu genro Borba Gato, e seu sobrinho Francisco Pires Ribeiro. Integravam também o grupo índios e mamelucos, dentre os quais José Dias Pais, filho natural de Fernão, e ainda alguns negros. Não há também, segundo Taunay (1961, p.160), documentação precisa sobre o itinerário dessa bandeira. Entretanto, o que mais se faz crer é que a primeira parte do roteiro consistia no caminho percorrido de São Paulo ao rio das Mortes. Sobre a viagem, citemos Vasconcelos (1974, p.79):
"a marcha nenhuma dificuldade ofereceu até Guaratinguetá, região aberta efreqüentada, havia anos; mas dali em diante começaram a cair pela serra as brumas das terras ermas. Não eram [...] de todo ignotas as paragens da Mantiqueira [...] É, porém, para se imaginar com espanto a passagem destes novos Alpes por veréias, que o mato cegara e que só a bússola indicava nas caligens do Embaú".
A busca pela Mantiqueira, através da Garganta do Embaú, significava o abandono dos caminhos já conhecidos e o avanço por espaço antes percorrido por poucos, aberto através dos marcos das trilhas indígenas, ou das incursões de boiadeiros. *Tais trilhas eram orientadas, quase em sua totalidade, no sentido dos cursos d‟água. Havia, pelo caminho, trilhas já percorridas por outros viajantes, como Matias Cardoso, já há tempos no sertão, que implantava em diversas regiões roças e feitorias. Certamente, como já assinalamos, as expedições anteriores foram de grande valia para as que se seguiram, pois davam alento a quem viajava, e a certeza de se estar percorrendo o caminho certo. Assim, os viajantes da comitiva de 1674 seguiam as indicações da orografia e hidrografia e as trilhas já de marcadas,que sugeriam os melhores caminhos. Ultrapassar elevações, ir de uma bacia a outra, evitar caminhos íngremes e mais difíceis, tudo isso significava seguir através das gargantas naturais, onde as depressões, fendas e cortes norteavam o caminho a ser seguido. “Sempre que podiam, passavam pelo campo aberto, ao longo dos rios, facilitando assim a jornada”, assinalada Barreiros (1979, p.49). Essa maneira de viajar foi um legado indígena ao bandeirante e permitia ao expedicionário uma série de vantagens, como encontrar terrenos férteis para o plantio de roças, obtenção de caça e pescado. Não é demais dizer que os rios eram as estradas que guiavam os bandeirantes sertão adentro. Torres (1980, p.108) afirma que: Os bandeirantes sempre usaram de dois tipos de pontos de referências naturais durante as intermináveis excursões pelas florestas. Primeiro, os rios, cujos cursos subiam ou desciam, conforme era o caso, ou então os grandes picos azuis, marcos lançados pela natureza para indicar onde estava o ouro. O roteiro dos bandeirantes seguiu descendo pela região conhecida como Pinheirais, para pouco depois transpor o rio Passa-Trinta, atual Passa-Quatro, chegando a Capivari. Descansaram algum tempo num lugar ao qual chamaram Mbáépendi, que significa Pouso Alegre, seguiram para o Rio Verde, transpuseram o Rio Grande e estabeleceram oprimeiro arraial em Minas, na Ibituruna, ou Serra Negra. Dirigiram-se à Serra da Borda e atravessaram a região do Campo, entrando pelo Paraopeba e aí fundando o segundo arraial, batizado com o nome de Sant‟Ana. Finalmente, marcharam para o Anhanhonhacanha, quesignifica “água parada que some no buraco do mato”, e cuja região hoje corresponde ao distrito de Quinta do Sumidouro, pertencente à cidade de Pedro Leopoldo, na região metropolitana de Belo Horizonte. Esse foi o terceiro arraial fundado em território mineiro, e para o qual voltaremos nossa atenção. O mapa a seguir oferece-nos um panorama do arraial do Sumidouro e das áreas que o cercam, incluindo municípios e acidentes fisicos.
"O
começo da sabedoria é encontrado na dúvida; duvidando começamos a questionar, e
procurando podemos achar a verdade." (Pierre Abelard)