O SERTÃO
... Podemos começar pela capitania de São Vicente. O estabelecimento de Piratininga, desde a era de 1530, na borda do campo, significa uma vitória ganha sem combate sobre a mata, que reclamou alhures o esforço de várias gerações. Deste avanço procede o desenvolvimento peculiar de São Paulo.
O Tietê corria perto; bastava seguir-lhe o curso para alcançar a bacia do Prata. Transpunha-se uma garganta fácil e encontrava-se o Paraíba, encaixado entre a serra do Mar e a da Mantiqueira, apontando o caminho do Norte. Para o Sul estendiam-se vastos descampados, interrompidos por capões e até manchas de florestas, consideráveis às vezes, mais incapazes de sustarem o movimento expansivo por sua descontinuidade. A Este apenas uma vereda quase intransitável levava à beira-mar, vereda fácil de obstruir, obstruída mais de uma vez, tornando a população sertaneja independente das autoridades da marinha, pois um punhado de homens bastava para arrostar um exército, e abrir novas picadas, domando as asperezas da serra, rompendo as massas de vegetação, arrostando a hostilidade dos habitantes, pediria esforços quase sobre-humanos.
Sob aquela latitude, naquela altitude, fora possível uma lavoura semi-européia, de alguns, senão todos os cereais e frutos da península. Ao contrário o meio agiu como evaporador: os paulistas lançaram-se a bandeirantes.
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Escravos serviam de carregadores. Compunha-se a carga de pólvora, bala, machados e outras ferramentas, cordas para amarrar os cativos, às vezes sementes, às vezes sal e mantimentos. Poucos mantimentos. Costumavam partir de madrugada, pousavam antes de entardecer, o resto do dia passavam caçando, pescando, procurando mel silvestre, extraindo palmito, colhendo frutos; as pobres roças dos índios forneciam-lhes os suplementos necessários, e destruí-las era um dos meios mais próprios para sujeitar os donos.
Se encontravam algum rio e prestava para a navegação, improvisavam canoas ligeiras, fáceis de varar nos saltos, aliviar nos baixios ou conduzir à sirga. Por terra aproveitavam as trilhas dos índios; em falta delas seguiam córregos e riachos, passando de uma para outra banda conforme lhes convinha, e ainda hoje lembram as denominações de Passa-Dois, Passa-Dez, Passa-Vinte, Passa-Trinta; balizavam-se pelas alturas, em busca de gargantas, evitavam naturalmente as matas, e de preferência caminhavam pelos espigões. Alguns ficaram tanto tempo no sertão que “volviendo a sus casas hallaron hijos nuevos, de los que teniendolos ya a ellos por muertos, se habian casado com sus mujeres, llevando tambien ellos los hijos que habian engedrado en los montes”, informa-nos Montoya. Os jesuítas chamam à gente de S. Paulo mamalucos, isto é, filhos de cunhãs índias, denominação evidentemente exata, pois mulheres brancas não chegavam para aquelas brenhas.
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As bandeiras no século XVI devastaram sobretudo o Tietê, cujos numerosos Tupiniquins depressa desapareceram, e o alto Paraíba, chamado rio dos Surubis em Piratininga, segundo informa Glimmer; com o tempo foram-se alongando os raios do despovoamento e depredação, característico essencial e inseparável das bandeiras.
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Garganta do Sapucaí, Desfiladeiro de Itajubá, Meia Lua.....o caminho do Norte.