sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

(Transcrição) - CULTURA E OPULÊNCIA DO BRASIL André João Antonil

                                              Terceira Parte  
Cultura e Opulência do Brasil pelas minas do ouro 
                                              I  
Das minas do ouro que se descobriram no Brasil FOI SEMPRE FAMA CONSTANTE que no Brasil havia minas de ferro, ouro e prata. Mas, também, houve sempre bastante descuido de as descobrir e de aproveitar-se delas, ou porque, contentando-se os moradores com os frutos que dá a terra abundantemente na sua superfície, e com os peixes que se pescam nos rios grandes e aprazíveis, não tratavam de divertir o curso natural destes, para lhes examinarem o fundo, nem de abrir àquela as entranhas, como  persuadiu a ambição insaciável a outras muitas nações, ou porque o gênio de buscar índios nos matos os desviou desta diligência menos escrupulosa e mais útil. Na vila de São Paulo há muita pedra usual, para fazer paredes e cercas, a qual, com a cor,com o peso e com as veias que tem em si, mostra manifestamente que não desmerece o nome que lhe deram de pedra-ferro, e que donde ela se tira, o há. O que também confirma a tradição de que já se tirou quantidade dele e se achou ser muito bom para as obras ordinárias que se encomendam aos ferreiros. E, ultimamente, na serra Ibiraçoiaba, distante oito dias da vila de Sorocaba, e doze da vila de São Paulo, a jornadas moderadas, o capitão Luís Lopes de Carvalho, indo lá por mandado do governador Artur de Sá, com um fundidor estrangeiro, tirou ferro e trouxe barras, das quais se fizeram obras excelentes. Que haja, também, minas de prata, não se duvida, porque na serra das Colunas, quarenta léguas além da vila de Itu, que é uma das de São Paulo ao leste direito, há certamente muita prata, e fina. Da serra de Guamuré, defronte do Ceará, tiraram os holandeses quantidade dela, no tempo em que estavam de posse de Pernambuco. E, na serra de Itabaiana, há tradição que achou prata o avô do capitão Belchior da Fonseca Dória. E em busca de outra, foi alem do rio de São Francisco, Lopo de Albuquerque, que faleceu nesta sua malograda empresa. Mas, deixando as minas de ferro e de prata, como inferiores, passemos às de ouro, tantas em número e tão rendosas aos que delas o tiram. E, primeiramente, é certo que de um outeiro alto, distante três léguas da vila de São Paulo, a quem chamam Jaraguá, se tirou quantidade de ouro que passou de oitavas a libras. Em Parnaíba, também junto da mesma vila, no cerro Ibituruna, se achou ouro e tirou-se por oitavas. Muito mais, e por muitos anos, se continuou a tirar em Paranaguá e Curitiba, primeiro pó oitavas, depois por libras, que chegaram a alguma arroba, posto que com muito trabalho para o ajuntar, sendo o rendimento no catar limitado, até que se largaram, depois de serem descobertas pelos paulistas as minas gerais dos Cataguás e as que chamam do Caeté, e as mais modernas no rio das Velhas e em outras partes que descobriram outros paulistas; e de todas estas iremos agora distintamente falando.
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X - Roteiro do caminho da vila de São Paulo para as minas gerais e para o rio das Velhas.  
GASTAM COMUMENTE OS PAULISTAS, desde a vila de São Paulo até as minas gerais dos Cataguás, pelo menos dous meses, porque não marcham de sol a sol, mas até o meio-dia, e quando muito até uma ou duas horas da tarde, assim para se arrancharem, como para terem tempo de descansar e de buscar alguma caça ou peixe, aonde o há, mel de pau e  outro qualquer mantimento. E, desta sorte, aturam com tão grande trabalho. O roteiro do seu caminho, desde a vila de São Paulo até a serra de Itatiaia, aonde se divide em dous, um para as minas do Caeté ou ribeirão de Nossa Senhora do Carmo e do Ouro Preto e outro para as minas do rio das 
Velhas, é o seguinte, em que se apontam os pousos e paragens do dito caminho, com as distâncias que tem e os dias que pouco mais ou menos se gastam de uma estalagem para outra, em que os mineiros pousam e, se é necessário, descanso e se refazem do que hão mister e hoje se acha em tais paragens. No primeiro dia, saindo da vila de São Paulo, vão ordinariamente a pousar em Nossa Senhora da Penha, por ser (como eles dizem) o primeiro arranco de casa, e não são mais que duas léguas.  Daí, vão à aldeia de Itaquequecetuba, caminho de um dia.  Gastam, da dita aldeia, até a vila de Moji, dous dias.  De Moji vão às Laranjeiras, caminhando quatro ou cinco dias até o jantar.  Das Laranjeiras até a vila de Jacareí, um dia, até as três horas.  De Jacareí até a vila de Taubaté, dous dias até o jantar.  De Taubaté a Pindamonhagaba, freguesia de Nossa Senhora da Conceição, dia e meio. De Pindamonhagaba até a vila de Guaratinguetá, cinco ou seis dias até o jantar. De Guaratinguetá até o porto de Guaipacaré, aonde ficam as roças de Bento Rodrigues, dous dias até o jantar.  Destas roças até o pé da serra afamada de Amantiqueira, pelas cinco serras muito altas, que parecem os primeiros muros que o ouro tem no caminho para que não cheguem lá os mineiros, gastam-se três dias até o jantar. Daqui começam a passar o ribeiro que chamam Passa vinte, porque vinte vezes se passa e se sobe às serras sobreditas, para passar as quais se descarregam as cavalgaduras, pelos grandes riscos dos despenhadeiros que se encontram, e assim gastam dous dias em passar com grande dificuldade estas serras, e daí se descobrem muitas e aprazíveis árvores de pinhões, que a seu tempo dão abundância deles para o sustento dos mineiros, como também porcos monteses, araras e papagaios.  Logo, passando outro ribeiro, que chamam Passa trinta,  porque trinta e mais vezes se passa, se vai aos Pinheirinhos, lugar assim chamado por ser o princípio deles; e aqui há roças de milho, abóboras e feijão, que são as lavouras feitas pelos descobridores das minas  e por outros, que por aí querem voltar. E só disto constam aquelas e outras roças nos caminhos e paragens das minas, e, quando muito, têm de mais algumas batatas. Porém. Em algumas delas, hoje acha-se  criação de porcos domésticos, galinhas e frangões, que vendem por alto preço aos passageiros, levantando-o  tanto mais quanto é maior a necessidade dos que passam. E daí vem o dizerem que todo o que passou  a serra da Amantiqueira aí deixou dependurada ou sepultada a consciência.  Dos Pinheirinhos se vai à estalagem do Rio Verde, em oito dias, pouco mais ou menos, até o jantar, e esta estalagem tem muitas roças e vendas de cousas comestíveis, sem lhes faltar o regalo de doces.  Daí, caminhando três ou quatro dias, pouco mais ou menos, até o jantar, se vai na afamada Boa Vista, a quem bem se deu este nome, pelo que se descobre daquele monte, que parece um mundo novo, muito alegre: tudo campo bem estendido e todo regado de ribeirões, uns maiores que outros, e todos com seu mato, que vai fazendo sombra, com muito palmito que se come e mel de pau, medicinal e gostoso. Tem este campo seus altos e baixos, porém moderados, e por ele se caminha com alegria, porque têm os olhos que ver e contemplar na prospectiva do monte Caxambu, que se levanta às nuvens com admirável altura.  Da Boa Vista se vai à estalagem chamada Ubaí, aonde também há roças, e serão oito dias de caminho moderado até o jantar.  De Ubaí, em três ou quatro dias, vão ao Ingaí.  Do Ingaí, em quatro ou cinco dias, se vai ao Rio Grande, o qual, quando está cheio, causa medo pela violência com que corre, mas tem muito peixe e porto com canoas e quem quer passar paga três vinténs e tem também perto suas roças.  Do Rio Grande se vai em cinco ou seis dias ao rio das Mortes, assim chamado pelas que nele se fizeram, e esta é a principal estalagem aonde os passageiros se refazem, por chegarem já muito faltos de mantimentos. E, neste rio, e nos ribeiros e córregos que nele dão, há muito ouro e muito se tem tirado e tira, e o lugar é muito alegre e capaz de se fazer nele morada estável, se não   fosse tão longe do mar.  Desta estalagem vão em seis ou oito dias às plantas de Garcia Rodrigues.  E daqui, em dous dias, chegam à serra de Itatiaia.  Desta serra seguem-se dous caminhos: um, que vai dar nas minas gerais do ribeirão de Nossa Senhora do  Carmo e do Ouro Preto, e outro, que vai dar nas minas  do rio das Velhas, cada um deles de seis dias de viagem. E desta serra também começam as roçarias de milho e feijão, a perder de vista, donde se provêem os  que assistem e lavram nas minas.  
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Fonte: http://migre.me/cYVDY
Fonte do Mapa:  Cultura e Opulência do Brasil por suas Drogas e Minas - André João Antonil; introdução e notas por Andrée Mansuy Dinis Silva - São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2007 (Documento Uspiano 11), pág 257.



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