A ocupação dos sertões da Mantiqueira - As proibições de trânsito e fixação de grupos e
indivíduos eram, portanto, ineficazes. Nos sertões da Mantiqueira encontramos no livro de lançamento de
escravos de 1715, para o procedimento da capitação
para os denominados “moradores da Ibitipoca”, a
presença de 30 proprietários com uma posse total de
149 cativos.6 Esses dados comprovam, já nas primeiras
décadas da extração aurífera, propriedades de diferentes
dimensões, voltadas não só à extração do ouro de
aluvião como também às atividades agropastoris.7
Mas é a partir dos meados do século XVIII que a região
foi efetivamente ocupada. Centenas de sesmarias
foram doadas entre as décadas de 1740 a 1770,
sendo incentivada com isso a abertura de picadas e
trilhas entre as propriedades e dessas com os principais
canais de escoamento da produção, por mais que
bandos8 fossem publicados para conter a ocupação
descontrolada. A motivação das proibições não era outra
senão o controle da cobrança de quintos, mas, caso o
ouro não fosse encontrado, nada podia ser confiscado,
o que acabava por relaxar o controle e facilitar uma
ocupação mais ostensiva.9 Em janeiro de 1756, nas
notícias enviadas ao governador pelo capitão Manuel
Lopes de Oliveira, constavam informações sobre a
abertura de picadas na Freguesia da Borda do Campo,
nos chamados “matos gerais do Rio de Janeiro”. Junto
aos demais proprietários, o citado capitão empreendia
uma política de expansão de terras na região.10 A
autonomia desse potentado era garantida por sua rede
de parentes amigos, além de seus escravos armados.
O difícil estabelecimento de uma autoridade régia,
contraditoriamente, enfrentava a ação de indivíduos
como esse, mas, por outro lado, servia-se deles para
fazer-se presente em áreas mais distantes.
Nos assentos de batismos do povoado de Ibertioga
encontramos registros de nascimento de dois dos filhos
de Manuel Lopes de Oliveira. O capitão era originário da
Freguesia de São Pedro Couto de Pedroso, do Bispado
do Porto, e era casado com a fluminense Ana Maria
dos Santos.11 Sua filha Maria Ignácia, nascida em 1744, casar-se-ia mais tarde com José Aires Gomes,
sucessor de seu sogro no controle das terras e dos
novos descobertos e que, futuramente, se tornaria uma
importante figura da Inconfidência mineira, condenado
ao exílio e falecido em Angola. Filhas representavam,
acima de tudo, uma oportunidade para realização
de boas relações interpessoais. Como padrinho por
procuração da filha Maria Ignácia, encontramos o
contratador de tributos de entrada e negociante de
Vila Rica Domingos Ferreira da Veiga.12 As relações
consanguíneas e rituais das redes relacionais do
reduzido grupo de homens ricos da localidade se
reproduziam, ultrapassavam as fronteiras geográficas e
reforçavam os privilégios daqueles que se distinguiam
na América portuguesa.
Manoel Lopes de Oliveira era um típico representante
do grupo de portugueses que emigrou para o alto da
Borda do Campo nos meados do século XVIII. Nos
assentos de batismos relativos àquela região, desde
o primeiro registro em 1708 até o último coletado
para 1850, constatamos a presença de 524 pais de
origem portuguesa declarada e quase 100% deles entre
1740 e 1770, o que revela ser este o período de pico
da ocupação da região.13 Esse grupo fazia parte do
movimento populacional de chegada de portugueses
provenientes da região do Minho, noroeste de Portugal,
especialmente do arcebispado de Braga e Viana do
Castelo (Termos de Barcelos, Guimarães, e suas diversas
pequenas freguesias) e também dos arquipélagos
dos Açores e Madeira. Apesar do fluxo constante de
imigrantes portugueses para a região das Minas, o
número encontrado na Borda do Campo surpreendeu-nos.
Certamente foram estimulados pelos fatores próprios
de dispersão em Portugal e nas ilhas, tais como o
empobrecimento e a pressão demográfica vigentes
no noroeste português. Mas também os imigrantes
foram atraídos pelas vastas possibilidades de acesso
a terras minerais, agricultáveis e propícias à criação,
disponíveis no centro-sul da América portuguesa, assim como a presença de uma população lusa residente,
de primeira ou segunda geração, já entranhada no
território. Ademais, a chegada como sesmeiro ou mesmo
posseiro numa área pouco controlada pelas autoridades
metropolitanas afigurava-se como uma excelente
oportunidade para se iniciar uma carreira no além-mar.
Pelo exposto até agora, percebemos que as ordens
régias proibindo a construção de picadas na região
(1720, 1733 e 1750), e mesmo a confirmação do
“distrito da Mantiqueira” como área proibida (1755),
não surtiram o menor efeito. No mínimo uma dezena de
pequenos povoados foi fundada na região durante esse
período, circundada por uma extensa área de exploração
agrícola, pastoril e mineradora. André F. Rodrigues, ao
levantar documentação referente às viagens oficiais e
exploratórias na Mantiqueira realizadas pelas autoridades
portuguesas com objetivo de constatar a situação de
devassamento das áreas e potencialidade da extração
mineral, descreve a surpresa de D. Rodrigo José de
Meneses com a situação encontrada. Diante do quadro,
o governador decidiu repartir legalmente as terras entre
os indivíduos sem título formal ou entre aqueles que
manifestassem esse interesse. Dessa forma, buscava
incorporar populações dispersas e inadimplentes,
subordinado-as ao pagamento de tributos.14
Os grupos sociais
Citamos até agora a presença marcante dos portugueses que para o alto da Borda do Campo emigraram, estimulados pelo livre acesso à terra e lavras de ouro, ausência de uma intensa fiscalização e controle por parte das autoridades. Paralelamente a esse grupo, percebe-se a presença de centenas de “nacionais”, lusos de segunda ou terceira gerações, fluminenses e paulistas provenientes de Parati, Pindamonhangaba e Taubaté. Tornar-se proprietário de terras na Borda do Campo, região próxima às estradas de escoamento de mercadorias para os mercados mais distantes, representava uma importante oportunidade tanto para os chamados “paulistas” como para portugueses. É importante salientar que, simultaneamente ao processo formal de doação de sesmarias, havia espaço para o intruso, o homem livre pobre disposto a arrendar terras para a produção agropastoril, ou mesmo um assento para sua família com pequena roça de milho e feijão. A documentação levantada por nós referenda esse contexto de expansão da fronteira de ocupação na região.
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Fonte: Revista do Arquivo Público Mineiro http://migre.me/vBOfO
Parafraseando: Alto da Serra, Caminho Geral do Sertão, espaço colonial de Piquete-SP, onde se deu a instalação do Registro de Itajubá, lado Paulista. Marmelópolis-MG, lado Mineiro, antiga Soledade de Itajubá, região localizada onde passam às estradas de escoamento de mercadorias para os mercados mais distantes, representava uma importante oportunidade tanto para os chamados “paulistas”
Os grupos sociais
Citamos até agora a presença marcante dos portugueses que para o alto da Borda do Campo emigraram, estimulados pelo livre acesso à terra e lavras de ouro, ausência de uma intensa fiscalização e controle por parte das autoridades. Paralelamente a esse grupo, percebe-se a presença de centenas de “nacionais”, lusos de segunda ou terceira gerações, fluminenses e paulistas provenientes de Parati, Pindamonhangaba e Taubaté. Tornar-se proprietário de terras na Borda do Campo, região próxima às estradas de escoamento de mercadorias para os mercados mais distantes, representava uma importante oportunidade tanto para os chamados “paulistas” como para portugueses. É importante salientar que, simultaneamente ao processo formal de doação de sesmarias, havia espaço para o intruso, o homem livre pobre disposto a arrendar terras para a produção agropastoril, ou mesmo um assento para sua família com pequena roça de milho e feijão. A documentação levantada por nós referenda esse contexto de expansão da fronteira de ocupação na região.
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Fonte: Revista do Arquivo Público Mineiro http://migre.me/vBOfO
Parafraseando: Alto da Serra, Caminho Geral do Sertão, espaço colonial de Piquete-SP, onde se deu a instalação do Registro de Itajubá, lado Paulista. Marmelópolis-MG, lado Mineiro, antiga Soledade de Itajubá, região localizada onde passam às estradas de escoamento de mercadorias para os mercados mais distantes, representava uma importante oportunidade tanto para os chamados “paulistas”