sexta-feira, 15 de junho de 2012

NÚCLEO EMBRIÃO DE PIQUETE, SERRAS ALTAS, "MUROS ALTOS, PARA QUE NAS MINAS NÃO CHEGUEM OS FRACOS" EM DESCRITO NA OBRA "O RETRATO DO REI" UM ROMANCE HISTÓRICO DE ANA MIRANDA

 

(Transcrição) Frei Francisco chegou ao Pindamonhangaba e dali atingiu o Guaratinguetá. Mais dois dias caminhando até o pôr-do-sol, e ultrapassou o porto de Guaipacaré, onde ficavam as roças de Bento Rodriguez. Três jornadas depois avistou o Paraíba correndo no meio de um vale. A viagem transcorria com lentidão quando frei Francisco, feliz, ouviu um sino ecoando. A estrada melhorou, tornou-se mais larga, pavimentada de pedras grandes. Avistou ao longe Mariana e seu cortejo. Às margens do Paraíba, um rio caudaloso cercado de rochedos, havia um povoado com cabanas e uma pequena igreja sobre uma colina coberta de plantações de bananeiras. Atrás de uma das casas, pastavam cavalos que serviam de muda à escolta do ouro. A travessia do rio, avolumado pelas chuvas dos últimos dias, estava extremamente perigosa. As águas corriam com força. Uma balsa frágil transportou as salvaguardas e os cavalos para o outro lado. Os animais, com olhos vendados, relinchavam. Mariana, Valentim e Aurora fizeram a travessia numa canoa. Mariana estava pálida e Aurora vomitou tudo o que tinha no estômago. No rancho, viajantes divertiam-se com mulheres; mulas comiam milho num coche; recoveiros empilhavam rolos de couro recheados de tabaco. A dormida naquele rancho não era paga, mas os preços que se cobravam na venda eram suficientes para compensar a hospedagem gratuita. A venda, uma casinhola de barro onde se ofereciam farinha em sacos, forragem, aguardente, vitualhas, ficava um pouco distante das casas. No povoado, escravos retiravam baús do lombo de animais. À beira do rio limpavam as alabardas, molhavam as correias; verificavam as ferraduras dos cavalos, as peças dos carros; faziam consertos. Moradores conversavam, agachados; espreitavam os viajantes com desconfiança. Mariana pediu a Valentim que alugasse uma das casas para pousarem. Quando ele voltou, disse que conseguira uma cabana abandonada. Mariana e Aurora foram acomodar-se na casinhola que cheirava como um estábulo. Havia barris de pólvora, vazios; sacos de milho seco rasgados pelos ratos, selas roídas, uma gaveta de ferro enferrujada, um banco quebrado, estrume no chão. Improvisaram colchões usando peles sobre palhas. O vento entrava pelas frestas da casa. Durante um longo tempo Mariana conversou com Aurora sobre o catecismo, enquanto penteava seus cabelos. Aurora perguntou se uma mulher podia conceber sem um homem, como a Virgem Maria. De noite, Valentim e as salvaguardas conversavam perto dali, quando chegaram algumas cortesãs. Uma delas achegou-se a Valentim.  Que bela noite, senhor , ela olhou o céu.  Sim, que bela noite.  Posso ficar convosco? Ele mandou que a mulher se sentasse.
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Já entramos no Sertão das Minas? , perguntou Mariana, ao atingirem o sopé de uma montanha.  Sim, disse Valentim, abaixando-se e recolhendo um punhado de terra vermelha.  Aqui começa o Embaú. Embaú quer dizer garganta, vale. Estais vendo aqueles morros? Valentim apontou uma massa verdejante de matas. São a Mantiqueira , ele disse.  Muros altos, para que nas Minas não cheguem os fracos. Valentim lavou a cara e as mãos numa fonte, examinou os cavalos e as mulas, saltou no dorso de seu animal e ordenou a partida. Viajou adiante, sempre a algumJá não fazia mais calor, a região das caligens era fresca mesmo com sol alto. Os nomes dos lugares se referiam a um detalhe da paisagem, a um fato ocorrido na região: Passa Vinte, Passa Trinta, riachos que se cruzavam vinte, trinta vezes; Pinheirinhos, onde floresciam bosques de pinheiros, lugar de roças de milho, abóbora, feijão, feitas pelos descobridores paulistas; Rio Verde, uma corrente de águas esverdeadas, com plantações às margens; Boa Vista, uma paisagem de campo regado por ribeirões; Rio Grande, cujas águas causavam medo pela violência com que corriam; Rio das Mortes, onde muitos
haviam morrido ao atravessarem a correnteza ou em refregas de pelouradas. Mariana divertia-se olhando os papagaios, as corujas, os tucanos, as antas. Ria das vacas magras soltas nas campinas. Respirava com força o ar úmido que vinha das matas. Bebia água das fontes, molhava os pés nos regatos gelados, comia palmitos e mel. As alturas lhe davam uma sensação de bem-estar.a distância das mulheres, junto com o condutor, às vezes sumindo numa curva. O negro que os guiava sorria como um sagüi e falava baixo, escondendo a boca com a mão. Valentim conversava com ele, saltava do cavalo para observar a trilha, afastava a vegetação, previa os perigos, decidia a direção a ser tomada.
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Fonte:  Miranda, Ana, 1951- O retrato do rei / Ana Miranda. — São Paulo : Companhia das Letras, 1991.   pág.  109/117  http://migre.me/9uN79

GUIA DA UNESCO - Una guía para la administración de sitios e itinerarios de memoria.

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