quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

PORTUGUÊS E CASTELHANO NO BRASIL QUINHENTISTA (Transcrição)

a) A origem dos missionários:
Nas missões dependentes de Portugal é conhecido o facto de que ainda que a maior parte dos missionários fossem portugueses, outros países, mormente Espanha, enviaram grande número de operários, tanto para o Oriente como para o Brasil 25. Exemplo disso é o navarro Francisco de Xavier (1506-1552), que trabalhou no Oriente luso e utilizou o português em dois terços da sua produção escrita. 
26. De facto, a grande maioria dos jesuítas que trabalharam na missionação do Brasil eram portugueses 27. Houve, porém, alguns espanhóis que tinham entrado na Companhia em Portugal (Azpilcueta, Blázquez e Anchieta), e que, portanto, pertenciam desde a origem à Assistência jesuítica lusitana. Ora bem, tendo sido frequentes os pedidos de reforços por falta de pessoal, resultou a ida, para o Brasil em 1561, de um belga, de um italiano, e de dois espanhóis: Quiricio Caxa e Baltasar Álvarez. Em 1572 chegou o P. Ignacio Tolosa. Os últimos espanhóis idos para o Brasil no século XVI foram enviados em 1576: Juan Saloni (catalão),  Agustín de Castillo (de Madrid), Pedro Ámena o de Toledo (natural de Granada), Francisco Ortega (cántabro), e Miguel García (de Lagartera, Toledo) 28. Diferente é o caso de Francisco de Escalante (c.1563-c.1632), natural de Laredo, que entrou para a Companhia no Rio de Janeiro. A finais do século, vários religiosos espanhóis ocupavam ofícios importantes no Brasil. Na expedição missionária que ia para o Brasil em 1570, preparada e chefiada pelo P. Inácio de Azevedo, havia um total de 73 jesuítas, dos quais 13 eram espanhóis 29. Como é sabido, dita expedição nunca chegou ao Brasil pois foi destruída ao ser assaltada por calvinistas franceses no mar das Canárias, morrendo a maioria dos expedicionários durante as duas investidas: a primeira a 15 e 16 de Julho de 1570 (primeiro grupo de 40 mártires) e, a segunda, a 13 e 14 de Setembro de 1571 (segundo grupo de 12 mortos)30. No entanto, anos depois, houve algumas queixas com respeito aos espanhóis 31.Assim, é curioso o que em 1575 escrevia o Procurador em Lisboa ao  P. Geral, no sentido de que «como esos hermanos que vienen  ingleses sin saber la lengua de por ca como podran aprovechar en el Brasil» 32. Assim, de 1588 a 1609 foram para o Brasil uns 50 missionários, todos de nacionalidade portuguesa, ao longo de nove expedições. Assinalemos que também houve missionários doutras nacionalidades, os quais, evidentemente, também aprendiam o português. Por exemplo britânicos, como o londrino John Made33, ou como o P. John Vincent Yate, de Salisbury, de que se conservam duas cartas remetidas do Brasil em língua inglesa, escritas em 1593; numa delas pedindo inclusive uma gramática inglesa34.Cedo houve também vários italianos35, como o napolitano P. Leonardo Armínio (1545-1605), do qual se conservam dois textos: um em latim e outro em castelhano —lembremos que naquela altura Nápoles dependia politicamente da monarquia espanhola—; ou como o P. João Baptista Giaccopuzi (c.1539-1590), de Spezia, de que também ficaram dois textos: um em italiano e outro em latim, ambos dirigidos ao P. Geral36. E também houve missionários de outras nacionalidades37. Por volta do ano 1600 havia no Brasil uns 160 jesuítas. A partir do início do século XVII com certo espírito anti-espanhol, mesmo antes de 164038, os missionários não portugueses eram fundamentalmente italianos e centro-europeus39. Aliás, para além dos portugueses que no Brasil ingressaram na Companhia de Jesus, houve também brasileiros, nascidos no Brasil; o primeiro deles foi um chamado Cipriano, que entrou já em 1552 40.
b) A questão do tupi: Uma das regras da Companhia de Jesus é que todos aprendam a língua da terra onde residem, se não virem que é mais útil a sua própria41. Muito cedo perceberam os jesuítas que uma só língua era falada por todos os grupos que habitavam o litoral brasileiro, desde as capitanias mais setentrionais até São Vicente, no sul: o tupi, língua brasílica ou simplesmente língua geral. Ao chegarem os Padres ao Brasil verificaram que, para atrair e catequizar os índios, era indispensável saber a língua deles. De facto, desde muito cedo operou-se a aprendizagem da língua tupi por parte dos missionários42. Entre os primeiros jesuítas, o que mais se assinalou na língua tupi foi o P. Juan de Azpilcueta Navarro, segundo Nóbrega, talvez por ser «biscainho» 43. Mas a redução da língua tupi a regras ou «arte» gramatical foi obra de Anchieta com a sua  Arte de Gramática da Lingoa mais usada na costa do Brasil , que talvez fosse escrita primeiro em latim e que depois foi publicada em Coimbra (1595). Anos depois viria a Arte da Língua Brasílica do P. Luís Figueira (1621), com a totalidade do texto em português44. Na escola ensinava-se português, mas a doutrina era com frequência em tupi, sobretudo com os meninos recém-vindos do mato: bilinguismo na educação, como não podia ser doutro modo. Particularmente curiosas são algumas misturas linguísticas que encontramos nos documentos. Assim, por exemplo, na sua «Relação da Província do Brasil» (1610), Jácome Monteiro apresenta-se a si próprio, numa frase meia tupi, meia portuguesa, como «O Paí Jacomi xerapí do Paí Guaçu»45. Do Ir. Cipião — o italiano Cipione Comitoli — diz-se que meteu-se com tanto empenho à língua tupi, «que às vezes lhe falava homem portuges e elle respondia brasil»46. Portanto, ainda que o nosso objectivo neste trabalho seja analisar o bilinguismo luso-castelhano, não podemos esquecer o facto evidente de que no Brasil daquele tempo, assim como posteriormente, o principal bilinguismo dava-se entre o português e o tupi. É interessante o que a este propósito escrevia António de Sá em 1559 aos companheiros da Baia:«Yo enseño agora acá la doctrina christiana y las oraciones en nuestro romance [...]. Si allá tuvieren alguna manera de enseñar en lengua brasílica mán-denosla, porque de otra manera difficultosamente se les meterá en la cabeça, aunque les bozeen cada hora y cada momento. Ellos me dizen que nuestro romance es muy trabajoso de tomar, mas no por eso les dejo de enseñar todos los días [...], y algunas vezes hablo en lengua brasílica con ellos lo que sé, y conténtansse mucho»47. (Fonte: http://migre.me/hfwlx
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