sábado, 1 de outubro de 2016

IDENTIDADES ÉTNICAS DOS ESCRAVOS EM VILA RICA DOS SETECENTOS - CAPÍTULO IV: Os Enterros de Escravos (Transcrição)

Os Enterros de Escravos “E porque é alheio da razão e piedade cristã, que os senhores, que se serviram de seus escravos em vida, se esqueçam deles em sua morte, lhes  encomendamos muito, que pelas almas de seus escravos defuntos mandem dizer missas, e pelo menos sejam obrigados a mandar dizer por cada um escravo, ou escrava que lhe morrer, sendo de quatorze anos para cima, a missa
de corpo presente, pela qual se dará a esmola acostumada”. 89.
Em seu livro quarto, as Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia ordenavam aos senhores que cuidassem do sepultamento de seus escravos e escravas, mas nem sempre os senhores seguiam os preceitos da Igreja.  Em Salvador, a Irmandade de São Domingos do Convento de São Francisco chegou a fazer uma petição ao rei, na qual informava a precária situação dos defuntos escravos: (...) “e da mesma sorte acontece freqüentemente lançarem os defuntos corpos nos adros das igrejas principalmente de religiosos os quais se vêem precisados  a dar-lhe sepultura, pois tem os senhores por mais barato esta inumanidade do que experimentar as demoras, e embaraços das averiguações da sua pobreza, com que muitas vezes, além de se corromper primeiro o cadáver, fica totalmente  ificultada a sepultura”90 Em 1693, D. Pedro II, mostrando preocupação com as condições dos negros no Brasil, escrevera ao cabido da catedral do Rio de Janeiro mandando assegurar a todos os escravos  moribundos os últimos sacramentos. O rei fora informado de que os sacramentos não eram ministrados em parte porque os padres  cobravam taxas exorbitantes, e, em parte, porque os senhores se recusavam a chamar padres para assistir aos escravos moribundos.  Em Minas Gerais, a situação fora diferente, os relatos das atas de óbito de escravos nos informam sobre circunstâncias diferentes. Em Vila Rica, o destino dos escravos sem proteção confrarial ou dos cuidados para esse fim do seu senhor era o adro ou cemitério da igreja Matriz 91 . Este recinto, dotado de covas com reduzida qualificação espiritual, tinha pouca aceitação por parte das populações livres (branca e parda) durante o setecentos e primeiro terço do oitocentos. O adro da Matriz foi, sem dúvida, a maior necrópole na Capitania das Minas.Geralmente permaneciam neste cemitério os defuntos escravos, não filiados a Irmandade do Rosário dos Pretos ou naquelas de crioulos (Mercês e Misericórdia, Mercês e Perdões, São José dos Homens Pardos, São Francisco de Paula, Nossa Senhora das Dores, Santa Efigênia no Alto da Cruz, etc.) 92
Na Paróquia de Nossa Senhora da Conceição do Antônio Dias, além do adro ou cemitério da Matriz, também foram utilizados adros de outras capelas para o enterramento de escravos. Abaixo apresentamos uma tabela por período com a distribuição dos sepultamentos de escravos na Paróquia de Nossa Senhora da Conceição do Antônio Dias:
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Observa-se que a maioria dos escravos era, de fato, sepultada no adro ou cemitério das capelas, havendo uma predominância do adro da Matriz. A capela do Rosário dos Pretos foi a que mais enterrou escravos em seu interior. Esse fato ocorre, pois muitos escravos eram irmãos da Irmandade o que lhes garantia uma “boa morte” e estar juntos aos seus.
 A entrada dos escravos nas confrarias pode ter sido motivada pela busca da "boa morte", como avalia Soares, a justificativa para a criação das confrarias de pretos vinha freqüentemente associada ao fato de os escravos serem abandonados por seus senhores depois de velhos e doentes, tendo seus cadáveres deixados no adro das igrejas.  Os sepultamentos feitos de acordo com as normas eclesiásticas deviam corresponder,  grosso modo, ao universo dos filiados a irmandades que conseguiam cumprir todas as exigências
do sepultamento cristão, o que, mesmo nas irmandades, nem sempre era fácil. As exigências constituíam-se em administrar os sacramentos ao moribundo e, após o falecimento, realizar a encomendação do corpo, a preparação em mortalha adequada, o
transporte e o sepultamento com a presença de um religioso, missa e velas. Paga-se o padre, a mortalha, a sepultura, a missa e também as velas94. Concluímos que nos dois períodos pesquisados a maioria dos irmãos da capela de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos era escrava de procedência mina e todos foram sepultados dentro da capela. É o caso de José Mina que foi enterrado em 10/02/1764 dentro da capela nossa Senhora do Rosário dos Pretos do Alto da Cruz onde era Irmão e com Cecília preta mina enterrada em 29/10/1774 dentro da capela do Alto da Cruz, também irmã95.
Os ritos fúnebres não apenas prestavam homenagem ao morto, ajudando-o a trilhar o caminho para o outro mundo, mas, em sua pompa, mostravam o poder da irmandade em cuidar de seus membros e enterrar seus mortos. Daí o fato de, mesmo nos enterros dos  irmãos de menor destaque, a irmandade comparecer, chorar e carregar o morto até a sepultura. Também as missas solenes de corpo presente e pelas almas dos irmãos falecidos, assim como os cortejos fúnebres, as procissões eram oportunidades para renovar
a solidariedade do grupo e demonstrar à sociedade a importância da irmandade. Segundo Scarano, esse é o motivo da condenação de ausências e omissões dos irmãos nessas ocasiões96.
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FONTE: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO JOÃO DEL REI INSTITUTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS POLÍTICAS E JURÍDICAS DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA ISÂNIA DAS GRAÇAS SILVA Link http://migre.me/v7usz

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